Show, Don’t Tell: o que é a técnica, onde e como é usada?

Show, don’t tell é uma técnica de narração que pode ser utilizada na escrita e seu objetivo é trazer mais imersão e verdade para seu texto. A ideia é focar nas ações ocorrendo em cena e descrever os detalhes sensoriais, em vez de narrar tudo de forma expositiva. Além disso, usar o show, don’t tell pode ajudar o leitor a se aproximar e se conectar com seus personagens.

Nesse post, vamos te ajudar a entender o significado da expressão e te mostrar como encaixar essa técnica no seu processo de escrita, além de trazer alguns exemplos práticos de como outros autores fizeram uso dessa regrinha. Venha entender melhor esse recurso e aprender como deixar seus textos mais interessantes!

O que significa “Show, don’t tell”?

“Show, don’t tell”, em tradução literal, significa: mostre, não conte. Isso quer dizer que, como escritores e narradores, nossa função é principalmente mostrar ao leitor uma história. Ele deve se sentir parte do que lê, e essa técnica é uma maneira excelente de gerar imersão.

Onde é usada a técnica Show, don’t tell?

É bem comum vermos exemplos do show, don’t tell nas mídias visuais, como em filmes ou peças de teatro. Quando um filme, por exemplo, nos mostra uma personagem saindo de lojas caras enquanto carrega várias sacolas, andando em uma limusine com motorista particular, chegando em sua mansão e sendo recepcionada pelo mordomo, não é preciso que a obra nos diga que tal personagem é rica. Ela já mostrou esse fato.

Porém, essa técnica pode (e deve!) ser utilizada também na literatura e esse é o nosso foco por aqui!

O que é a técnica “show, don’t tell” para escritores?

Nós, escritores, trabalhamos com um formato diferente de mídia, mas, na prática, não é muito diferente. A ideia é focar nos detalhes da narração, explorando as sensações e dando destaque a elas, para gerar uma maior imersão em sua história.

Além disso, evite a exposição em excesso. Eu sei que às vezes queremos deixar tudo bem explicadinho, para não haver dúvidas daquilo que estamos tentando contar. Mas é legal confiar na capacidade do nosso leitor de chegar às suas próprias conclusões.

Como aplicar o show, don’t tell na minha escrita?

Abaixo, falaremos um pouco mais sobre as possibilidades de aplicação da técnica em seus textos.

Crie uma sensação de ambientação

Imagine um personagem chegando em algum lugar. É interessante para o leitor entender as sensações que esse local desperta em seu personagem, e quais as percepções que ele tem. Nossa intenção é fazer com o que o leitor se sinta lá também!

Por exemplo, ao invés de contar que o lugar está escuro ou claro, se o leitor estivesse ali, precisaria forçar a vista para enxergar na penumbra, ou sentiria os olhos doerem pelo excesso de iluminação? Pense em sons, aromas, texturas, e depois é só partir para a descrição!

Use o diálogo para mostrar o personagem

Os diálogos, quando bem escritos, são excelentes ferramentas para a aplicação do show, don’t tell. A forma que um personagem se comunica com os outros e como diz o que pensa também são boas maneiras de mostrar sua história. Diálogos expositivos demais, onde os personagens explicam tudo nos mínimos detalhes e contam cada ação realizada, podem se tornar chatos e cansativos.

Nos diálogos você tem a oportunidade de apresentar muitas das características de seus personagens, sem precisar contar isso diretamente para seu leitor. José é tímido e fala pouco? Ótimo! Mostre José respondendo seu supervisor no trabalho de forma monossilábica. Marcelo é arrogante e se sente superior a todos? Você pode aproveitar de um diálogo em um primeiro encontro para fazer ele se gabar de suas qualidades.

Em caso de dúvida, sempre descreva a ação

Se não está conseguindo enxergar nenhuma brecha para aplicar o show, don’t tell, pense no que seu personagem está fazendo. Como ele faz isso? É possível transformar a descrição dessa ação em algo mais complexo?

Se seu personagem está se locomovendo até algum lugar, como é esse trajeto? Ele pode estar caminhando lentamente, correndo desajeitado, andando com passos largos… Há várias formas diferentes de se realizar uma mesma ação e o pulo do gato é mostrar ao leitor com mais detalhes o que o seu personagem está fazendo, em vez de apenas informar que ele está fazendo algo.

Use detalhes fortes, mas não exagere

Sim, o uso do detalhamento na descrição é algo essencial para que o show, don’t tell funcione. Porém, para não entediar o leitor, não exagere na dose. Não queremos que seu texto seja redundante, então é importante estar atento à quantidade de detalhes que você está descrevendo. O segredo é o equilíbrio!

Tente cortar tudo aquilo que não for essencial para criar a ambientação e compreensão da cena descrita. Escolha os elementos mais importantes e dê destaque a eles.

Não use palavras que “explicam a emoção”

Quando se pensa em emoções, as palavras mais básicas surgem primeiro à mente: feliz, triste, bravo. A jogada aqui — e o grande desafio — é a capacidade de descrever tais emoções sem lançar mão do nome de cada uma. Pense comigo: O que acontece com seu corpo quando você está nervoso? Os batimentos cardíacos aceleram, as bochechas esquentam enquanto você sente o sangue subir para a cabeça e suas mãos tremem… ótimo! Comece por aí. É essencial entender o que acontece com o nosso físico e mental quando sentimos determinadas emoções, para trazer mais realismo ao momento.

Esqueça as palavras básicas e use verbos fortes

Sim, descrever sensações é o grande trunfo na hora de colocar em prática o show, don’t tell. Mas um cuidado que devemos tomar é evitarmos aquilo que já está batido. Palavras como “senti”, “vi”, “ouvi”… palavras que contam sensações e ações básicas. Vamos lá, escritor, eu confio no seu potencial! É hora de explorar esse vocabulário e introduzir novas formas de descrever sensações e ações.

Mais uma vez vamos pensar em como a situação se desenrolou para conseguirmos criar uma narrativa mais imersiva e original. Podemos substituir essas expressões básicas por outras maneiras mais complexas de descrever a mesma ação. Em vez de escrever que Joana disse alguma coisa, pense em como ela disse tal coisa. Joana sussurrou? Sibilou entre os dentes? Sua voz estava trêmula ou firme e decidida? Explore as nuances!

Descreva a linguagem corporal

Da mesma forma que emoções provocam sensações em nosso corpo, nossa postura e expressões faciais também entregam de bandeja aquilo que se passa dentro da nossa cabeça. Seus personagens funcionam da mesma maneira. A forma que eles se portam pode ser carregada de intenções, então é preciso se atentar para expressar uma postura que seja condizente com aquilo que seu personagem está pensando ou fazendo.

Exemplos de show, don’t tell

Gado — Helena Leão

“Apesar de a última semana ter se resumido a dor, sede e fome, apesar do gosto amargo do vômito verde, mistura de bile e as folhas que engolia no caminho pra enganar o estômago, apesar do cheiro de pus que vinha do corte em seu dedo indicador que a corda da viola havia rasgado há quase um mês, mas teimava em não fechar, nesta manhã ele acordou com um sinal de que suas preces seriam em breve atendidas.”

Nesse trecho da obra Gado, Helena utiliza elementos sensoriais como o gosto amargo na boca e o cheiro de pus da ferida não cicatrizada, para trazer à tona a exaustão do boiadeiro.

I Bite Back — Koral Reis

“Acredito que isso é possível até deitar de bruços na maca e ter aquela mão firme na minha perna. Era difícil raciocinar sentindo o polegar dele contra a parte interna da minha coxa, causando um formigamento que subiu para o centro do meu quadril. Tentei me concentrar no barulho irritante da máquina me perfurando, no desconforto da pele machucada, mas era aquele dedo afundando na minha carne que me deixava maluca.”

Já em I Bite Back, Koral cria uma tensão palpável narrando com detalhes o que a personagem Cecilia estava sentindo em seu corpo e percebendo ao seu redor.

Cicatrizes e Demônios – Amanda Campos

“Era outono e as folhas das árvores já estavam começando a cair, prontas para receber o inverno que viria em poucos meses. O clima estava ameno, uma leve brisa batia em meu rosto, trazendo o cheiro de flores até minhas narinas, fechei brevemente os olhos e respirei fundo, deixando aquele aroma preencher meus pulmões.”

Amanda nos traz a sensação outonal da cena, além de descrever de forma imersiva o aroma no ar, em vez de simplesmente contar que o personagem sentiu o cheiro das flores.

Fora de Alcance – Leticia Stiegler

“Para quem não conhecia Axel Scott há muito tempo como Summer, ou acabou de conhecê-lo como a dupla de pai e filho, não notou seu meio sorriso forçado, a mandíbula trincada, o virar sutil de cabeça a cada vez que Arthur falava alguma coisa para Summer. Fora os punhos cerrados se segurando para não fazer besteira.”

Através da descrição da linguagem corporal de Axel, conseguimos identificar a raiva do personagem, sem que isso precise ser dito em palavras.

Conclusão

Como vimos nesse artigo, a regra do show, don’t tell, quando bem utilizada, pode ser um recurso narrativo para trazer mais imersão às suas histórias e deixar suas tramas mais interessantes e originais. Não se esqueça que uma imagem vale mais do que mil palavras, então bora pintar essa imagem na mente do leitor!

Esperamos que as dicas reunidas por aqui ajudem a tornar mais fácil e prazeroso seu processo de escrita, para que seus textos sejam cada vez melhores.

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2 comentários em “Show, Don’t Tell: o que é a técnica, onde e como é usada?”

  1. adorei saber mais sobre a técnica, estou começando a escrever e me ajudou bastante inclusive a identificar quando vejo isso em outros textos

  2. já conhecia o termo dentro do contexto cinematográfico e achei demais ele ser usado no meio literário,dá espaço pra subjetividade e imaginação dos outros por não ser tão literal <3

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